terça-feira, 10 de agosto de 2010

O espelho!

"Acordei atordoado... Quantos sonhos eu havia sonhado? O dia anunciava o fim da claridão.. o ponteiro já estava mostrando a escuridão!"


Eu sempre passava, naquele mesmo horário, naquele mesmo local e sempre aquele mesmo velho estava sentado no mesmo banco lendo o seu tão "mesmo" livro (que por final nunca se findava). Curioso como sou e tão dependente de minhas proprias indagações pus-me a perguntar - ou até melhor- imaginar o que aquele Senhor fazia de fato da vida.
Os tantos será's de nossa vida apareciam assim - como clarões - em minha mente. Me perguntava tanto sobre ele: se ele trabalhava ainda; se ele morava proximo daqui; se ele era aposentado; se ele tinha família; se ele sabia realmente ler (porque nunca terminava o livro da
capa preta).
E sempre, na contemplação do velho Senhor, meu ônibus vinha e na curva da esquina eu o perdia de vista. Então abria algum livro que eu houvera iniciado - sou muito rápido na hora de ler - e comecei a degustar dos olhos sedentários daquela Capitu voraz.

Mas aí houve este dia que eu entediado de ver aquela figura repetida no meu album de figurinhas me dirigi até o banco e por lá sentei. Fingi não notá-lo, mas mesmo assim ele me olhou e com um belo sorriso me deu: Boa noite meu jovem!
Bom! Ele falava! Era meio fantasioso pra mim. De certa forma, havia algo naquele velho que
me ligava fortemente a ele. AH! Não contive-me e indaguei tão sem escrupulos as minhas diversas asneirices.
Ele arregalou o olhar e com certeza deve ter me imaginado uma pessoa perturbada do juizo: - O que há de errado em sentar-se num banco da praça e nele contemplar o entardecer? Bem, não há erro nenhum (imaginei eu). Aqui onde vivo não tem pessoas que contemplam o entardecer numa tarde tão ensolada. Não! Definitivamente não.
Monologuei (tipico de mim) e ele notando que eu estava conversando intrisecamente voltou-se ao seu livro (velhissimo por sinal): - O Senhor não acaba nunca de ler este livro? Sempre o vejo com este mesmo, sempre o da capa preta e sem titulo.

- Meu jovem, que mal há ler um livro e contemplar as palavras que o autor nos incumbiu a interpretar? Há mal em tentar perceber a mensagem principal do livro? Em devorá-lo, não substancialmente mas sim moralmente? Em filosofar a ideia e o fascinio do autor e descobrir qual a sua opinião da obra? Em se imaginar na história? Em viver a história? Meu jovem, você por mais que leia mil livros por ano, ainda não descobriu a essencia de uma boa leitura.
Aquela palavras me partiram ao meio. Que desaforado! Não, não eu! O velho! Ele não precisava se utilizar daquelas palavras, por mais que eu tenha provocado à ele usá-las. Contudo, não havia lhe dado ouvidos. Meu ônibus veio e mais uma vez o perdi na curva da proxima parada. Só que as indagações já haviam se passado e nem pensava mais na doce imagem do velho sentado no banco. Estava cheio daquela mesma figurinha e findei-me por jogá-la fora.
Noutro dia, cheguei na parada um pouco mais cedo. O sol ainda se escaldava em cima de minha cabeça e olhar para o banco (despercebido pela força do hábito) pude enfim, não ver
mais aquela imagem. É! Eu acho que ela não irá mais ser repetida: O velho não estava no banco lendo o seu livro velho. Talvez fosse cedo ainda para sentar-se e "contemplar o entardecer".
O ônibus veio. Subi; paguei a passagem e sentei no lado da janela. O sol irritantemente me tocava os olhos e me confundia bastante a visão. Permaneci um pouco com os olhos fechados,
esperando a curva da proxima parada para os edificios taparem a grande bola que ofuscava meus olhos. Senti que o calor nas minhas buchechas havia cessado e que a sensibilidade nos olhos já estava indo embora. Fui abrindo os olhos bem devagar e quando pude enfim abrí-los por completo dei-me um grito de supetão ocasionado por um susto (ou surto?). Estava lá! Na janela, refletindo por cima de minha imagem a imagem do velho da praça. Eu estava me vendo nele. Como que é isso? Apavorante.
Tudo ficou nublado. Via na minha frente agora apenas uma grande poça d'água. Como se pequenas gotas de chuva tocassem a superficie e com efeito fisessem aqueles pequenos redemoinhos. Minha cabeça girou um pouco. Sensação mais esquisita esta. O que está
havendo.
Então me vi em pé diante aquele espelho. Conhecia o lugar na palma da mão. Meu recinto, meu abrigo, meu quarto. Como uma pessoa sonha de olhos abertos? Desta vez eu não sonhei com os olhos da mente. Desta vez eu sonhei com os olhos da imaginação. Dois caminhos que
andam lado a lado, mas que são distintos entre si.
Via à mim mesmo refletido na imagem de um homem sábio, sempre com O livro na mão, sentado para contemplar um momento em minha vida. E
agora tudo fazia sentido, apesar de saber que tivera saido uma ilusão. Não foi!
Era eu naquele banco, era meu aquele livro, contemplando o morrer do sol. Não um velho e sim um homem que carregava em suas mãos a experiência de quem havia vivido. O livro da sabedoria. Era a vida que me corriam por entre os olhos. Por isso não largava mais. Porque a cada dia eu degustava um pouco mais dela. A cada dia, era um por-do-sol diferente.
Então as lágrimas caíram de meus olhos. Feliz, triste e amável. Limpo, puro, confortável. O tempo não muda. Ele é constamente certinho pra falar a verdade. O que muda é o modo como nós o carregamos em nossas vidas. Em nossos livros. E ao olhar o futuro o problema é que todas as vezes que olhamos para ele é vê-lo mudar. Porque nós olhamos para ele, mudando
todo o resto.

"De fato não havia dormido...
Nem sequer sonhei.
Adormeci e em frente ao meu próprio espelho
fiz o favor de (não me perder) me achar um 'pouquin'. "


(Olhe-se no espelho. Veja-o e descubra quem mora dentro de você. Aprenda com você e viva com você. Evolua e voe o mais alto que você puder e carregue a você mesmo em suas costas. Porque você é de você mesmo)

Não voltei por não havia ido embora. Não declaro meu retorno porque o tempo
está mudado. Eu fiz questão de mudá-lo e agradeço pelos tantos amigos que puxaram minha orelha para eu alimentar o Palavras do Sol. A minha constante mudança. Não prometo por mim, mas por vocês voltar aqui mais vezes. Infelizmente não como antes, mas... não os deixarei.

Grande abraço.



2 comentários:

  1. Meu caríssimo Robério!

    Você anda sumido e sua ausência, com absoluta certeza, é sentida!

    Então, aproveitando o gancho do seu texto, fica o convite para também perceber-se nos diversos espelhos que construiu nessa trajetória matizada pela virtualidade.

    Espelhos, fragmentos de cada um, vistos, saboreados, inteligidos, lidos, imaginados, enfim, "ajuntados" ao "eu" de cada um, permitindo-se fazer melhor; permitindo saber-se melhor, inacabado, é bem verdade, mas consciente do inacabamento que reclama o outro como espelho dos atos que humanizadoramente nos refaz, instante após instante!

    Então, esse dom de "tocar" as pessoas no seu jeito de escrever, não pode ser largado na estrada, em qualquer canto empoeirado... Não! Ele aqui é reclamado! E, permita-me, aqui, "você não é só de você"... É parte de cada um que já transita seu universo...

    Aquele abraço! Grande abraço!

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  2. Olá Rob...

    Quando nos imaginamos num futuro longínquo, espelhamos no presente os reflexos do passado. Isso porque a história de si mesmo faz parte do interesse existencial atual, e da realidade que insiste em apostrofar sua existência.

    Cientes dessa realidade, nós que somos seus "amigos imaginários" precisamos nos alimentar dos teus pensamentos literários como alimentava-se aquele bom velho de seu livro.

    Não tenha essas "simpáticas cobranças" como forma de "aperreio", mas sabes que talentosos devem exercitar os seus talentos e apenas nos posicionamos como admiradores do seu.

    Parabéns!
    Betinho do Bem
    http://sites.google.com/site/reflexaoemocao/

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